06
maio 2015
Esta é a segunda postagem, de dez, sobre o uso de falácias por Rachel
Sheherazade em grande parte, senão em quase todos, de seus argumentos
conservadores.
Depois dos últimos conflitos no complexo do Alemão no Rio
de Janeiro entre traficantes e a polícia… depois do saldo de quatro
mortes, entre eles, um garoto de dez anos, moradores saem às ruas da
favela em protesto contra a polícia.
Distorção de fato, falácia de omissão – Sheherazade distorce
sutilmente a razão do protesto e omite a gravidade da situação que levou
os moradores da comunidade a protestarem contra a atuação local da PM.
Manifestantes liderados por coletivos culturais e
associações de moradores gritavam “Fora UPP” e vaiavam os policiais que
acompanhavam a manifestação.
No protesto nenhuma palavra de ordem contra a presença e a
violência dos traficantes, eles sim o motivo dos constantes combates
que transformaram os morros em praça de guerra.
Falácia de omissão 1 – Omite-se aqui a violência policial, que tem
sido cada vez mais absurda e torturado e assassinado cada vez mais
pessoas inocentes. Ignora-se que a violência policial tem sido tão ou
mais cruel quanto a dos criminosos civis.
Falácia de omissão 2 – A jornalista omite também aquilo que tem sido o
plano de fundo da “praça de guerra” mencionada por ela: a “guerra às
drogas”.
Falácia de omissão 3 – Nega-se o contexto histórico do narcotráfico em bairros pobres do Rio de Janeiro, ou seja, por que o narcotráfico começou a surgir ali e se há de fato ou não cumplicidade da polícia nesse tipo de atividade criminosa.
Total inversão de valores: o bem transformado em mal.
Falsa dicotomia – Sheherazade promove um irresponsável maniqueísmo ao
carimbar a PM como “do bem” e os narcotraficantes e outros criminosos
civis como “do mal”, quando a comunidade tem denunciado constantemente
que a polícia tem agido de forma tão criminosa quanto o narcotráfico.
Para parte da comunidade, a polícia é uma intrusa. É
visita sem convite. É a causa de todos os males da população porque está
nos morros para combater o crime.
Falácia de omissão, distorção de fato – Omite-se e distorce-se a
problemática da criminalidade nas comunidades pobres sob ocupação
militar no Rio de Janeiro. Omite-se o cometimento de crimes por parte da
própria PM e distorce-se o contexto e a essência da violência que tem
castigado aquelas comunidades. Pinta os PMs como se fossem anjos
guerreiros lutando contra demônios, quando na verdade há policiais
cometendo crimes contra inocentes como sequestro, tortura, homicídio
qualificado e, segundo rumores, participação no próprio narcotráfico.
E os traficantes precisam vender sua cocaína livremente, querem tocar o terror em paz. Polícia para que?
Falácia de omissão – Novamente esconde-se as razões históricas que
deram origem ao narcotráfico nos morros cariocas e a ação abusiva e
criminosa da própria polícia.
Fato é que a comunidade é parte refém e parte cúmplice do tráfico.
Falácia de omissão 1 – Absolve-se, sem qualquer investigação decente,
a responsabilidade da PM na problemática criminal dessas comunidades.
Falácia de omissão 2 – Não se revela como e por que parte dos moradores desses bairros tem sido “cúmplice do tráfico”.
Porque o traficante violento e fora da lei é o mesmo que
oferece a proteção, que faz a “justiça” na comunidade, e claro, que
emprega os aviões, fogueteiros, chefes de boca…
Falácia de omissão – Mais uma vez omite-se o envolvimento de policiais no cenário criminal local.
Por medo ou conveniência, o morador da favela não pode ou não quer apoiar a polícia, a ordem, o Estado.
Distorção de fato, falácia de omissão – Sheherazade pinta a situação
como se os moradores fossem pessoas inconsequentes e sem noção por não
estarem apoiando a ação repressiva do Estado. Esconde-se que esse medo
também é medo da própria PM, que tem agido tão ou mais criminosamente do
que o narcotráfico.
Então, trava-se uma espécie de “guerra civil”: a lei contra o crime. E, claro, não há como enfrentar fuzis com flores nas mãos.
Falsa dicotomia, distorção de fato, falácia de omissão – Novamente
pinta-se o inexistente maniqueísmo entre PM boazinha e heroica e
narcotraficantes vilões malignos, distorcendo a realidade sobre o
cenário criminal nos morros ocupados pela PM no Rio e escondendo os
crimes dos policiais.
Infelizmente, no meio desse fogo cruzado, entre polícia e bandidos, sobram os inocentes.
Distorção de fato, falácia de omissão – Distorce-se o que realmente
tem acontecido nessas comunidades – leia-se a violência policial – e
omite-se que os inocentes são vitimados também pela PM.
O juiz de Goiânia, Jessier Coelho autorizou, esta semana,
o abortamento de um bebê de cinco meses, que sofre de anencefalia, ou
seja, má formação do cérebro. A maioria dos anencéfalos nasce sem vida.
Outros sobrevivem, mas por pouco tempo.
Anfibologia, distorção de fato – Não está muito claro se esses cinco
meses são de gestação ou de idade. Só se sabe que é um feto porque a
palavra “abortamento” é dita, mas a confusão fica plantada. Inclusive há
a possibilidade de que a omissão da expressão “de gestação” após “cinco
meses” tenha acontecido justamente para confundir o telespectador, que
pode se sentir induzido a crer que um feto de cinco meses de gestação
não é muito diferente de um bebê já nascido com cinco meses de idade.
A decisão do magistrado, ele mesmo reconhece, não tem
previsão legal. O abortamento no Brasil é considerado crime e só há dois
casos em que ele é permitido: gravidez resultante de estupro ou quando a
gestação põe em risco a vida da mãe. Apesar disso, o aborto de
anencéfalos tem sido cada vez mais comum desde que, em 2012, o Supremo
Tribunal Federal decidiu, por oito votos a dois, autorizar a interrupção
da gravidez quando comprovada a deficiência.
Falácia de omissão – Omitiu-se que o aborto de fetos anencéfalos
deixou de ser considerado crime e passou a ter previsão legal graças à
decisão do STF.
Agindo assim, o Judiciário tomou, indevidamente, para si,
as atribuições do Legislativo. Aos juízes cabe julgar conforme o
disposto em lei. Ao Congresso, formular leis.
Falácia de omissão – Há a possibilidade, no Direito brasileiro, de o
Poder Judiciário exercer algum papel legislativo provisório quando o
Poder Legislativo se omite ou se nega a legislar sobre determinada
questão dotada de fundo constitucional.
Mais informações aqui.
Essa foi também a crítica do ministro Ricardo
Lewandowsky, que votou contra a liberação do aborto. Segundo ele, o STF
não pode legislar em substituição ao Congresso. Também contrário ao
abortamento dos anencéfalos, o então ministro Cesar Peluso foi duro em
seu voto. Disse que o procedimento é cruel e uma atitude egocêntrica da
mulher, afinal, o feto não pode ser destruído para amenizar um
sentimento de frustração.
Falácia de omissão 1 – Omite-se que os votos dos dois foram votos vencidos na decisão do STF.
Falácia de omissão 2 – Omite-se a opinião dos ministros que votaram a favor do direito da mulher a abortar fetos anencéfalos.
Falácia do espantalho – O ministro Peluso comete a falácia ao
associar a decisão da mulher de abortar a um mero “sentimento de
frustração”, quando na realidade há razões muito mais profundas que
levam uma mulher a essa decisão, como o sofrimento de estar gestando um
ser que vai morrer de qualquer maneira pouco depois de nascer.
Para Peluso, não se pode reduzir o anencéfalo à condição de lixo, uma coisa imprestável e incômoda.
Falácia de omissão 1 – Omite-se que o feto anencéfalo não é
senciente, por ser carente de um cérebro, e que seres não sencientes não
são pacientes morais (seres capazes de sofrer as consequências
negativas de uma ação moral).
Falácia de omissão 2 – Peluso recusa-se a pensar no sofrimento da
mulher gestante de um feto anencéfalo, impondo um desonesto reducionismo
ao discutir a questão.
Falsa analogia – Compara a decisão da mulher de abortar um feto
anencéfalo dotado de chance zero de sobreviver à mera vontade de uma
pessoa de descartar um saco de lixo.
Eu temo que decisões como essa acabem abrindo uma porta
para mais exceções, legalizando-se, por exemplo, o aborto eugênico, que
artificialmente seleciona os bebês aptos a viver e destinados a morrer,
de acordo com seus defeitos físicos ou mentais.
Redução ao absurdo (reductio ad absurdum) – Sheherazade
supõe uma consequência absurda indesejável que, no entanto, é improvável
e nada evidencia que venha realmente a acontecer como consequência da
legalização do aborto de fetos anencéfalos.
Seria como reviver o pesadelo do ideal purista de Hitler,
onde só uma raça superior teria direito a existir. Na Alemanha Nazista,
milhões de pessoas foram mortas simplesmente por serem deficientes
físicos, mentais, judeus, negros ou homossexuais.
Falácia da bola de neve – A jornalista imagina que, logo depois da
suposta legalização do aborto eugênico, “o pesadelo do ideal purista de
Hitler” seria “revivido”, num encadeamento de eventos absurdos
indesejados que, apesar do medo supostamente expresso, são improváveis
de acontecer como consequência da legalização do aborto de fetos
anencéfalos.
Falsa analogia – Compara indevidamente fetos que sequer têm condição
de sobreviver fora do útero com as vítimas do nazismo. É possível,
inclusive, perceber que Sheherazade cometeu um grave desrespeito contra
as vítimas do nazismo, ao compará-las com fetos anencéfalos.
Para o cirurgião inglês Peter Saunders, a anencefalia é
uma deficiência grave, incurável, mortal, mas não tira do feto sua
humanidade. Bebês anencéfalos são profundamente dependentes, e devem ser
tratados com o mesmo amor e respeito que qualquer ser humano prestes a
morrer merece.
Falácia de definição muito ampla – Traz um conceito demasiadamente amplo de humanidade individual.
Falta de clareza – Não explicita qual é o conceito dado sobre a
humanidade de um indivíduo. Faz uma menção vaga e confusa sobre o que
seria essa “humanidade” individual.
Falsa analogia – Compara indevidamente fetos que não vão sobreviver
fora do útero com seres humanos já nascidos que estão em leito de morte,
quando na verdade há diferenças substanciais entre ambas as categorias.
1 – Liana Friedenbach, 16 anos, sequestrada, torturada, estuprada, esfaqueada e morta pelo menor Champinha, de 16 anos.
2 – Victor Deppman, 19 anos, estudante – assassinado com um tiro na cabeça na porta de casa por um menor de 17 anos.
3 – João Hélio Fernandes morto aos seis anos de idade,
depois de ser arrastado pelo asfalto por 7 km e 10 intermináveis
minutos. O acusado de fechar a porta do carro e deixar a criança
pendurada pelo cinto de segurança foi o menor “E”.
4 – Rodrigo Silva Netto, 29 anos, músico da banda Detonautas, assassinado a tiros por um assaltante menor de idade.
5 – Yorrally Dias Ferreira, 14 anos, assassinada com um
tiro na cabeça pelo ex namorado, um menor de 17 anos que filmou a vítima
ensanguentada e distribuiu as imagens pela internet.
6 – Silmara da Cruz Alves, dona de casa, 31 anos,
assassinada a facadas por um assaltante de 17 anos por causa de 20
reais. Ele ria enquanto narrava o crime à polícia.
7 – Celso Mazzieri, jornalista, 45 anos, enforcado pelo namorado e mais dois menores de 17 anos.
8 – Lucas Bonfim de Jesus, um bebê de um ano e meio,
esfaqueado e decapitado por um menor de 17 anos, o “Neguinho da Máfia”
que aproveitou a ocasião para estuprar a mãe da criança.
9- Adriana Moura Miranda, 43 anos, estrangulada pela
filha menor de idade. O namorado ajudou a queimar e esconder o corpo da
vítima.
10 – Cinthya Magaly de Souza, dentista, 46 anos – queimada viva por um assaltante de 17 anos porque só tinha 30 reais na conta.
Eu tenho milhões de motivos para comemorar a primeira
vitória da PEC que reduz a maioridade penal. Esses que eu acabei de
elencar são apenas dez.
Todas as dez “razões” se enquadram na falácia de apelo à emoção – Não
trazem nenhum argumento lógico e racional que prove que a redução da
maioridade penal irá diminuir a criminalidade e impedir eficazmente que
novos crimes chocantes cometidos por adolescentes delinquentes
aconteçam. Ao invés, explora a indignação do telespectador para que ele
apoie de maneira completamente irracional e passional a proposta de
emenda constitucional que, se sancionada, misturará adolescentes
cometedores de delitos com criminosos adultos veteranos.
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