quinta-feira, 29 de março de 2018

'O Mecanismo': o que é verdade e o que é licença poética no seriado da Netflix

Foto: Divulgação Ver Mais

por Natalia Leal

Se ao lançar “O Mecanismo” o diretor José Padilha buscava uma grande repercussão – algo parecido ao que teve com “Narcos” e “Tropa de Elite”, ele conseguiu. A série lançada pela Netflix na última sexta-feira (23) com base na Operação Lava Jato despertou críticas e levou autoridades a se posicionarem publicamente. Movimentos de esquerda acusam a produção de propagar informações falsas, e até a ex-presidente Dilma Rousseff decidiu publicar uma nota a respeito disso. Diz que a série é capaz de “assassinar reputações”. 
 
O diretor, por sua vez, se defende. Lembra que o trabalho começa com uma tela de fundo preto em que o espectador lê o seguinte alerta: “Este programa é uma obra de ficção inspirada livremente em eventos reais. Personagens, situações e outros elementos foram adaptados para efeito dramático”. Depois, diz que a série mostra apenas o esquema de corrupção montado por políticos. “Um esquema que lesou os brasileiros, com a participação clara de Lula e de Temer, que, durante boa parte do tempo, foram sócios na corrupção sistêmica, lógica estruturante da política no Brasil”. 

Fato é que nem tudo que é mostrado em O Mecanismo aconteceu exatamente como aparece na tela. Mas também não se pode dizer que tudo ali é falso. Para enriquecer o debate e tentar diminuir a polarização, a Lupa selecionou três enredos – três partes da série – que constam na trama e que mesclam elementos reais com doses de dramatização. Atenção: contém spoilers! Veja a seguir:

O doleiro Roberto Ibrahim é preso por fraudes no Banco do Estado do Paraná em 2003. Ele faz um acordo de delação premiada, homologado pelo juiz Paulo Rigo e é libertado. Em 2013, dez anos depois, ele é um dos três primeiros presos da operação Lava Jato, junto com outros doleiros que mantinham uma casa de câmbio em um posto de gasolina em Brasília. Ibrahim é preso na capital federal, após fazer uma ligação para a filha e ter o celular rastreado pela Polícia Federativa. Ele estava lá para levar uma mala de dinheiro aos responsáveis pela campanha de Janete, candidata da situação. Depois de um tempo preso, ele faz um novo acordo de delação, ao lado de João Pedro Rangel, diretor da Petrobrasil, também preso na operação. O juiz que homologa a delação conjunta é o mesmo do caso de Ibrahim em 2003.



Roberto Ibrahim é um personagem inspirado no doleiro Alberto Youssef. Ele, de fato foi preso em um caso ligado ao Banco do Estado do Paraná (Banestado) e realmente fechou acordo de delação premiada, sob o compromisso de não voltar a cometer crimes financeiros. Quem homologou a delação foi o juiz Sergio Moro, à época com 31 anos de idade. 
 
Youssef também foi mesmo um dos primeiros presos da Lava Jato – no dia 17 de março de 2014, na primeira fase da operação. Ele realmente tinha uma mala de dinheiro consigo. Segundo o MPF, o valor chegava a R$ 1,4 milhão.
 
Entre os outros detidos, também estavam os doleiros Nelma Kodama e Carlos Habib Chater – este último, dono de uma casa de câmbio e sócio de Youssef. A casa de câmbio ficava em um posto de gasolina na Asa Sul, em Brasília, o Posto da Torre – que funciona até hoje, embora a casa de câmbio não exista mais.
 
Detido pela Lava Jato, Youssef fez um acordo de delação premiada com a Justiça em setembro de 2014. Essa delação é vista como uma das principais da Lava Jato, porque deu os primeiros detalhes sobre o esquema feito entre doleiros, partidos, empreiteiras e estatais. Seu conteúdo colaborou para o trabalho dos investigadores. Quem homologou a delação foi o juiz Sergio Moro, então com 41 anos.
 
 

A primeira fase da operação Lava Jato teve 15 mandados de prisão preventiva expedidos – não apenas três, como mostra a série O Mecanismo. No total, eram mais de 40 mandados, entre prisões e busca e apreensão.
 
Youssef foi preso, na verdade, em São Luís, no Maranhão, no hotel Luzeiros, um dos mais luxuosos da cidade. Portanto, não estava em Brasília, e a ligação para a filha – que deu brecha para que o celular fosse rastreado na série – também não é real. O doleiro estava no Maranhão para fazer um pagamento da empreiteira UTC a um secretário do governo de Roseana Sarney – a ex-governadora nega qualquer envolvimento no esquema.
 
Youssef não fez um acordo de delação conjunto com Paulo Roberto Costa, que inspira o personagem João Pedro Rangel, na série. Na verdade, Paulo Roberto é o primeiro delator da Lava Jato e teve seu acordo homologado em agosto de 2014. Youssef é o segundo, com o acordo homologado em setembro de 2014. Ou seja: se na série, o advogado que solicita que eles façam a delação impõe a condição de que sejam os dois ao mesmo tempo para que a colaboração seja assinada, na vida real, cada um cuidou da sua parte.
 

Quando a Lava Jato estoura, o ex-presidente Higino pede ao seu ex-ministro da Justiça, conhecido como Mago e como Bruxo, que dê um jeito e faça algum acordo com a Procuradoria-Geral da República de forma a frear a operação. O ex-presidente diz que é preciso “estancar a sangria”. O Mago faz, então, uma reunião com um grupo de empreiteiros para que um acordo seja proposto à PGR. A ideia dele, depois de uma conversa com o procurador, era que as empresas pagassem uma indenização de R$ 1 bilhão à União, com o reconhecimento da participação nas fraudes. Apenas uma das empreiteiras recusa o acordo. Mas, de qualquer forma, ele não sai pois o Mago morre antes de selar o compromisso.



As empreiteiras investigadas na Lava Jato realmente contaram com a consultoria jurídica de um ex-ministro da Justiça. Márcio Thomaz Bastos, um dos maiores advogados criminalistas do país, “exercia um papel informal de coordenador das defesas e escolheu boa parte dos defensores dos principais investigados”, de acordo com reportagem publicada pelo Jota publicada após a morte dele, em 2015.
 
Em 2016, o jornal O Globo publicou uma reportagem com detalhes da negociação. A reunião aconteceu seis meses após o início da Lava Jato, em setembro de 2014. Nela, Bastos apresentou o valor de R$ 1 bilhão, que “teria surgido a partir de conversas (…) com o procurador-geral da República, Rodrigo Janot”. O montante deveria ser pago pelas empresas que integravam o chamado “clube das empreiteiras”, ou seja, as que atuavam em sistema de cartel nas licitações da Petrobras. O pagamento seria acompanhado de um reconhecimento da participação nas fraudes. 

A PGR nunca admitiu que houve qualquer tentativa de acordo com os empreiteiros para parar a Operação Lava Jato. E, segundo o jornal O Globo, a proposta foi recusada na própria reunião entre os empresários. A principal oposição veio das empreiteiras Odebrecht, OAS e Engevix. Ou seja: o acordo, de fato, nunca foi feito, e as investigações prosseguiram.



“Estancar a sangria” realmente é uma expressão que ficou conhecida no âmbito da Lava Jato. Mas não na boca de um ex-presidente – nem sequer nos primeiros meses da operação. Quem disse isso foi o senador – e à época ministro do Planejamento – Romero Jucá (MDB), em conversa telefônica com o ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado,  interceptada pela operação. Isso ocorreu em maio de 2016, ou seja, no terceiro ano da Lava Jato. É bom lembrar que a série de José Padilha retrata acontecimentos dos primeiros seis meses de operação. 
 
Em O Mecanismo, o “clube das empreiteiras” é chamado de “clube dos 13”, referência ao número de empreiteiras que integraria o esquema investigado por PF e MPF. Mas o que se sabe é que há mais do que 13 empreiteiras envolvidas na Lava Jato. Seriam, pelo menos 17. Além disso, havia um “clube VIP”, formado por seis empresas: Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez, Odebrecht, OAS, Queiroz Galvão e UTC. Essa divisão foi formada, segundo as investigações, em 2007.
 
Na série, durante a reunião em que o Mago apresenta uma espécie de minuta do acordo, apenas uma empreiteira se opõe: a Miller & Bretch, representada pelo diretor, Ricardo Bretch – inspirado em Marcelo Odebrecht. Todos os outros 12 concordam com a tentativa de acordo e, inclusive, fazem as contas para que o valor de R$ 1 bilhão seja dividido apenas entre eles, desconsiderando a 13ª empresa que integra o esquema. Na realidade, a discussão foi um pouco mais dura, com discordância de outras empresas
 
Na cena, Ricardo Bretch ainda faz um discurso mencionando o cuidado que tem com os pagamentos de propina feitos pela empreiteira. A referência é ao Setor de Operações Estruturadas da empreiteira Odebrecht, descoberto mais tarde e confirmado em delação de diretores da própria empresa. A divisão tinha executivos e coordenava todo o pagamento de propina a políticos feito a partir dos contratos com a Petrobras.
 
Sobre a morte do Mago: embora o roteiro da série dê a entender que o acordo entre empreiteiros e PGR ficaria de pé se o ex-ministro da Justiça não tivesse morrido, na linha do tempo da operação Lava Jato real, é bem diferente. Na série, os empresários são presos só depois da morte do ex-ministro. Na vida real, os empreiteiros começaram a ser presos no dia 14 de novembro de 2014. Marcio Thomaz Bastos, que inspira o personagem Mago, morreu no dia 20 de novembro daquele ano.
 

Com as delações de Ibrahim e JPR, a Polícia Federativa parte de vez para cima das empreiteiras. Mas o juiz Paulo Rigo exige que um dos envolvidos no esquema fale antes de autorizar as prisões. O investigador afastado Marco Rufo convence o dono da Estruturax a colaborar com a PF. A partir do depoimento dele, são emitidos mandados de prisão para executivos de 12 das 13 empresas envolvidas no esquema. Apenas a Miller & Bretch escapa – é alvo de um mandado de busca e apreensão, e nada mais. A fase em que os empresários são presos é batizada de Juízo Final. Quando eles começam a chegar na carceragem da PF em Curitiba, Ibrahim já foi liberado, usando tornozeleira eletrônica. JPR, no entanto, permanece no local.
 
 

 
 
As delações de Alberto Youssef e Paulo Roberto Costa de fato embasaram boa parte do que a PF investigou a partir dali sobre as empreiteiras. A 7ª fase da operação Lava Jato, que foi mesmo batizada de Juízo Final, é quando começam a ser presos os grandes empresários ligados ao esquema fraudulento das licitações e obras da Petrobras. Essa fase foi deflagrada em 14 de novembro de 2017 e nela foram detidos executivos, diretores e sócios de oito das nove empresas que, até então, se sabia que faziam parte do cartel. A Odebrecht, que inspira a Miller & Bretch da ficção de José Padilha, realmente ficou de fora da primeira onda de prisões. Marcelo Odebrecht só foi detido na 14ª fase da Lava Jato, em junho de 2015.

 

Na série, a Juízo Final é retratada como a fase de prisão dos empreiteiros – e nada mais. Mas vale lembrar que Renato Duque, ex-diretor de serviços da Petrobras, também foi detido nessa etapa. Ao todo, foram expedidos 85 mandados judiciais, sendo seis de prisão preventiva e 21 de prisão temporária. 
 
Não há qualquer informação de que tenha havido um depoimento de diretor ou executivo ligado a uma das empresas do esquema antes das prisões, como o roteiro sugere. Na série, quem faz esse depoimento é um executivo da Estruturax, inspirada na real Engevix. O dono da Engevix, José Antunes Sobrinho, só se propôs a fazer um acordo de colaboração com a Justiça em 2015 – ele foi preso em setembro daquele ano, na 19ª fase da Lava Jato.
 
Na ficção, na chegada dos empreiteiros à carceragem da PF, o ex-diretor da Petrobrasil João Pedro Rangel ainda está detido. Mas Paulo Roberto Costa, que inspira o personagem, deixou a PF em 30 de setembro de 2014, um mês e meio antes de os empreiteiros chegarem. Em compensação, Padilha colocou Ibrahim fora da cadeia logo depois que a delação premiada foi fechada na série. Mas Youssef só deixou a carceragem da PF em novembro de 2016, usando tornozeleira eletrônica. Ou seja, ele estava lá quando os empreiteiros chegaram.
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quinta-feira, 15 de março de 2018

Brasil tem a 2ª população mais fora da realidade do mundo

Maria Fernanda Garcia




A pesquisa global Perigos da Percepção 2017 foi realizada em 38 países. No ranking, que compara opiniões da população com dados da realidade, os brasileiros só estão atrás dos sul-africanos.

As informações coletadas foram comparadas com dados de fontes oficiais, resultando no ‘Índice da Percepção Equivocada’. O ranking aponta as distorções entre opiniões e realidade. Os piores resultados foram da África do Sul (1º), do Brasil (2º), Filipinas (3º), Peru (4º) e Índia (5º).




A Ipsos entrevistou 29,1 mil pessoas dos 38 países, entre 28 de setembro e 19 de outubro, e a pesquisa mostrou que apenas 7% das pessoas entrevistadas no mundo pensam que a taxa de homicídio em seu país é menor do que em 2000. No entanto, ela é significativamente menor na maioria dos países. No Brasil, a taxa de homicídios é a mesma de 2000, mas 76% dos entrevistados acreditam que ela é maior.

Quando o assunto abordado é ataque terrorista, apenas 19% dos entrevistados no mundo pensam que os índices de mortes são menores do que eram 15 anos antes, mas na verdade o índice caiu na maioria dos países e, em geral, está em metade do que era antes.

Os brasileiros mostram uma percepção bem equivocada em relação aos imigrantes que estão presos no país. A maioria acha que a população carcerária é composta por 18% de presos imigrantes, mas a realidade é bem menor, a taxa é de 0,4%.

O Brasil também está fora da realidade quando a pergunta é qual é a proporção de brasileiros conectados à rede social Facebook. Os brasileiros acham que 83% da população está na rede social, mas a realidade é bem diferente: 47% dos brasileiros acessam a rede.

Outro dado interessante é que todos os países acreditam que a gravidez na adolescência seja mais frequente do que é na realidade, especialmente na América Latina e África do Sul. Os brasileiros foram os que mais erraram essa questão. O dado oficial é 6,7%, mas os entrevistados pensavam que fosse 48%. Mas não podemos comemorar: dos 38 países pesquisados, o Brasil é o que tem a maior taxa de gravidez na adolescência.

“O mais preocupante com os resultados desta pesquisa é que percepções erradas geram diagnósticos errados dos problemas do país e, consequentemente, soluções inadequadas”, afirma Marcos Calliari, CEO da Ipsos no Brasil.

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sábado, 3 de março de 2018

Igreja Universal é condenada a devolver dinheiro a fieis por charlatanismo religioso

03 de março de 2018, 11h30
 
Casal afirma que os pastores recolhiam dinheiro e falavam que quanto mais dinheiro fosse doado, mais Jesus daria em troca 

Por Redação
 
A Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd) foi condenada a pagar uma indenização de R$ 20 mil por danos morais a um casal, que afirma ter sido coagido a doar seus bens. Além disso, a igreja também terá que devolver celulares, impressora, aparelho de fax, ar-condicionado split ou pagar o valor equivalente a esses bens.

Na ação, os ex-fiés alegaram que passavam por problemas financeiros e procuraram a igreja. Disseram que os pastores recolhiam dinheiro e falavam que quanto mais dinheiro fosse doado, mais Jesus daria em troca. Afirmaram ainda que eram desafiados a fazerem donativos com o objetivo de provar a fé e sob ameaças.

A condenação inicialmente ocorreu Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. A Igreja Universal recorreu então ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), que manteve a sentença por unanimidade.

“Como ficou assentado no acórdão recorrido, as doações às instituições religiosas, de todos os matizes, são um componente essencial da liberdade de consciência e de crença garantida pelo artigo 5º, VI, da Constituição. No entanto, a hipótese dos autos narra uma situação excepcionalíssima em que as doações - conforme as provas colacionadas aos autos - foram resultado de coação moral irresistível, sob a ameaça de sofrimento e condenação espiritual”, afirmou a relatora do recurso especial da igreja, ministra Nancy Andrighi.

A Igreja Universal do Reino de Deus divulgou, em nota, que “o dízimo e todas as doações recebidas pela Universal seguem orientações bíblicas e legais, e são sempre totalmente voluntários e espontâneos. Por fim, esclarecemos que, neste processo, ainda há um recurso que aguarda a análise do Supremo Tribunal Federal (STF)”.