Carlos Carabaña 22 MAR 2015 - 15:36 BRT
Sir Thomas Lipton, um escocês que chegou até onde buscou na vida, em Norfolk, em 1937. / John Topham / TopFoto.co.uk (Cordon Press) |
Queixa vem do latim, de quassiare, de quassare, que
significa golpear violentamente, quebrantar, e expressa uma dor, uma
pena, o ressentimento, a inquietação… Um amplo espectro de sensações,
mas com um nexo comum: seu caráter negativo. E esse leva ao ódio e, como
é bastante sabido, o ódio leva ao lado escuro. Com isso em mente, os
amigos Thierry Blancpain e Pieter Pelgrims decidiram estabelecer em fevereiro o projeto Complaint Restraint February. Um mês de 28 dias em que não poderiam reclamar por besteiras.
Os benefícios dessa atitude têm duas caras. Por um lado, aumenta a sensação de felicidade. Por outro, as pessoas se dão conta de que certos conhecidos são muito negativos e te fazem mais infeliz
"Pieter e eu somos amigos há 10 anos, e temos trabalhado juntos em
muitos projetos e, no inverno de 2010, tivemos a ideia de deixar de nos
queixar por um mês”, conta Blancpain, por e-mail. Esse suíço criador de tipografias
não sabe de quem foi a sugestão, mas diz que um dos dois estava dando
aborrecimento e o outro pediu que se calasse durante um mês. “Como
depois nos sentimos mais felizes, decidimos repetir no ano seguinte”. Em
2014, perguntaram a alguns amigos se queriam se juntar e, depois de
verem que também sentiam os efeitos, em 2015 abriram ao público com um
site para que divulgassem o experimento. Esperavam ter 50 inscrições. No
fim, foram 1.750.
Depois de esclarecer que reclamar não é ruim por si só, Blancpain
explica que sua ideia é deixar de reclamar por coisas pequenas que, na
verdade, não importam. “A chuva, o bebê que chora no restaurante, o
chefe que te faz ficar uma hora a mais no escritório, o ônibus que você
perdeu na hora de ir trabalhar”. Acontecimentos que “vistos com
perspectiva não têm importância, e que reclamar é uma perda de tempo e
de energia”. “Se temos comida, casa, família, amigos… não deveríamos ser
felizes?”.
Ainda que reclamar em si não seja ruim, a ideia é não reclamar pelas pequenas coisas. “Se temos comida, casa, família, amigos… não deveríamos ser felizes?”
Segundo Blancpain, os benefícios dessa atitude têm duas caras. Por um
lado, aumenta “a sensação de felicidade” e diminui a de “estar
esgotado”. Por outro, adquirimos “conhecimentos sobre a forma como nos
comunicamos e como se comunicam as pessoas do nosso entorno”. Durante
esse mês, afirma que se dá conta de que certos conhecidos são muito
negativos e o fazem mais infeliz. “Pode soar duro, mas acho que não é
razoável passar tempo com uma pessoa com a qual nos sentimos pior
depois”.
Sem serem especialistas em psicologia, Blancpain e Pelgrims têm o
conhecimento resultante de anos de prática. Um truque é transformar
reclamações em sugestões positivas. “Se alguém vem e me conta alguma
pequena coisa negativa sobre seu trabalho, pergunto se não acha que seu
chefe horrível é sinal de que deve procurar um novo emprego”. Quando
você está mal e não pode estar na rua, sugere ir “ver um filme”. Alguns
vão um pouco mais longe e levam um elástico ao redor do punho com o qual
causam dor cada vez que se queixam alto, para se condicionar. “No
mínimo ajuda, mas o importante não é deixar completamente [isso
Blancpain considera impossível], e sim se dar contar e redirecionar essa
energia” para aspectos positivos.
Os criadores da iniciativa têm o conhecimento de anos de prática. Um truque é transformar as reclamações em sugestões positivas
Esse foi o primeiro ano que abriram ao grande público. Estimam que
foi um êxito. Alguns enviaram e-mails assegurando que tinham tornado
suas vidas melhores, outros comentaram que viram um efeito negativo em
suas vidas ao se dar conta de que tinham pessoas muito negativas em seu
entorno. O sucesso os pegou de surpresa, de forma que na próxima edição
pensam em preparar materiais, artigos, experiências… para ajudar a quem
quiser se unir.
Escolheram fevereiro por ser o mês mais curto do ano, e seria mais
fácil de conseguir, mas parar de reclamar não está limitado a esse
período. “Pode deixar de reclamar agora mesmo, esteja onde estiver, e
ter um melhor março, abril ou junho”. Só lembre que, se algo “realmente
ruim” acontecer em sua vida, melhor “contar a seus amigos”. Supõe-se que
tem que se sentir feliz, não miseravelmente sozinho.
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