Anualmente, empresas e milionários
deixam de recolher cerca de 10% do PIB nacional em impostos e tributos e
aumentam a carga sobre a renda da classe média e dos mais pobres
por Rodrigo Gomes, da RBA
publicado
01/03/2014 18:17
abr / arquivo rba
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Pessoas jurídicas e magnatas do país burlam o fisco e mais pobres pagam a conta. Reforma tributária é urgente |
São Paulo – A sonegação de impostos no Brasil
superou R$ 415 bilhões em 2013. O valor corresponde aproximadamente a
10% de toda a riqueza gerada no país durante o período e é maior que os
orçamentos federais de 2014 para as pastas de educação, desenvolvimento
social e saúde, somados. Neste ano, o total de impostos e tributos não
recolhidos já se aproxima dos R$ 68 bilhões. Os dados são do Sindicato
Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional (Sinprofaz), que organiza o
painel Sonegômetro.
O serviço calcula, a partir de estudos daquela entidade, o total de
impostos e tributos que deveriam, mas não são pagos, por obra das
chamadas pessoas jurídicas, isto é, empresas em geral, de todos os ramos
e tamanhos. Para comparação, o programa social do governo federal Bolsa
Família tem R$ 24 bilhões ao ano para atender 14 milhões de famílias.
Portanto, o que foi sonegado no ano passado equivale a 17 anos do
programa.
Ainda segundo o Sinprofaz, a soma dos tributos devidos pelos
brasileiros, constantes na Dívida Ativa da União, ultrapassa R$ 1,3
trilhão, quase um terço do Produto Interno Bruto (PIB) de 2013 que foi
de R$ 4,84 trilhões.
O estudo do sindicato se baseia em dados da Receita Federal, outras
análises específicas sobre cada tributo, para então elaborar uma média
ponderada. Os tributos não pagos são relativos a impostos diretos –
aqueles que não estão embutidos em produtos – como Imposto Sobre
Serviços (ISS), Programa de Integração Social (PIS),
Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins), por
exemplo. E escancaram a diferença com que o sistema tributário
brasileiro atua sobre ricos e pobres.
“Eles são sonegados pelos muitos ricos e por pessoas jurídicas
(empresas, indústrias), com mecanismos sofisticados de lavagem de
dinheiro e de caixa dois”, afirmou o presidente do Sinprofaz, Heráclio
Mendes de Camargo Neto, que é advogado e mestre em Direito.
A sonegação gigantesca, diz Camargo Neto, impõe a necessidade de
tributar pesadamente o consumo, onde não é possível sonegar. "É injusto
que todo paguem uma carga em tributos indiretos. E o povo paga muito.
Mesmo que você seja isento do Imposto de Renda, vai gastar cerca de 49%
do salário em tributos, mas quase tudo no supermercado, na farmácia",
explica.
Outra injustiça está na forma como incide o Imposto de Renda.
Quanto mais o contribuinte tem a declarar, maiores são as possibilidades
de abater valores. "Os mais ricos podem abater certos gastos no Imposto
de Renda. Em saúde, por exemplo, se você tem um plano privado um pouco
melhor, você pode declará-lo e vai ter um abatimento (no cálculo final
do imposto). Esta é uma característica injusta do nosso sistema. Os mais
pobres não conseguem ter esse favor."
No entanto, continua o advogado, quem tem salários a partir de R$
2.400 é tributado automaticamente pelo Imposto de Renda Retido na Fonte e
muitas vezes não tem como reaver parte deste valor.
Em 2005, o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário e a
Associação Comercial de São Paulo criaram o impostômetro, cuja versão
física está instalada no Pátio do Colégio, região central da capital
paulista. O objetivo, ao mostrar o tamanho da arrecadação do poder
público, é justamente debater a carga tributária do país, com vistas à
redução de impostos e à reforma tributária.
Logicamente, os valores registrados pelo impostômetro (R$ 313 bilhões
este ano, até o fechamento desta matéria) são superiores aos do
sonegômetro (R$ 68 bilhões), caso contrário nem sequer haveria dinheiro
para manter o funcionamento da maquina pública.
No entanto, alerta Camargo Neto, se o governo brasileiro efetivasse a
cobrança deste valor sonegado, já seria possível equalizar melhor os
impostos no país. “Se nós conseguirmos cobrar essas grandes empresas e
pessoas físicas muito ricas, o governo poderia desonerar a classe média e
os mais pobres. Seria o mais justo. Se todos pagassem o que devem, nós
poderíamos corrigir a tabela do Imposto de Renda (que incide sobre os
salários) e reduzir alíquotas sobre alimentos e produtos de primeira
necessidade, que todo mundo usa”, defende.
Desigual
Detalhando-se a carga tributária brasileira pelas principais fontes,
percebe-se que os tributos sobre bens e serviços, que afetam sobretudo
os mais pobres, respondem por quase metade do total (49,22%). Em seguida
vêm os tributos sobre a folha de salários (25,76%) e sobre a renda
(19,02%). Somados, eles respondem por 94% da carga tributária total.
Para o procurador, existe uma “escolha política” em não atuar na
cobrança dos mais ricos e manter a situação como está.
Uma demanda urgente, segundo o procurador, é uma reforma tributária,
que incida sobre o capital e deixe de onerar os trabalhadores. “É
preciso um avanço maior da tributação sobre a riqueza. Veja os lucros
astronômicos dos bancos, por exemplo. Por que o Banco do Brasil precisa
lucrar R$ 12 bilhões e não pode ser tributado sobre metade disso? Essa é
uma escolha política da sociedade. Imagine bilhões de cada um dos
grandes bancos, o quanto você poderia desonerar os produtos de primeira
necessidade?”, questiona.
Camargo Neto aponta ainda que a sonegação é maior por conta da
precariedade estrutural em que a própria Procuradoria da Fazenda
Nacional, responsável pela fiscalização sobre os tributos, se encontra.
Ele conta que existem 300 vagas de procurador abertas há pelo menos seis
anos esperando serem preenchidas.
"Nós não temos carreira de apoio, por exemplo. Há menos de um
servidor de apoio para cada procurador. Os juízes, por exemplo, têm de
15 a 20 servidores de apoio. Nós temos 6,8 milhões de processos para
cobrar e quase nenhum auxílio", denuncia.
Para completar, a sonegação de impostos prescreve em
cinco anos, o que aprofunda o favorecimento dos sonegadores e
sonegadoras. "É muito fácil se livrar com todas essas condições",
lamenta.
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